A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade, recebeu denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) no Inquérito (INQ) 3990, contra o deputado federal Vander Loubet (PT-MS), Ademar Chagas da Cruz, seu cunhado, e Pedro Paulo Bergamaschi de Leoni Ramos. Os fatos investigados referem-se a esquema de desvios no âmbito da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras, objeto de investigação na Operação Lava-Jato.
De acordo com a denúncia apresentada pela Procuradoria Geral da República (PGR), entre 2012 e 2014, o deputado, em razão de sua função pública, teria solicitado e recebido, por intermédio de sua esposa, Roseli da Cruz Loubet, de seu cunhado e “caixa de campanha”, Ademar Chagas da Cruz, e de Fabiane Karina Miranda Avanci, sócia de Ademar, o valor de pelo menos R$ 1.028.866,00 obtidos no âmbito de operações da BR Distribuidora. Os repasses das vantagens teriam ocorrido sob orientação de Pedro Paulo Bergamaschi de Leoni Ramos, apontado como operador do esquema de desvio de recursos da estatal, e por meio de empresas do doleiro Alberto Youssef.
No julgamento desta tarde (14), seguindo o voto do relator, ministro Edson Fachin, os ministros da Segunda Turma receberam a denúncia quanto aos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa imputados ao parlamentar e a Ademar Chagas da Cruz. No que diz respeito a Pedro Paulo, foi excluída a acusação quanto ao delito de organização criminosa, uma vez que ele já é investigado pelo mesmo crime em outro inquérito, mas foi recebida a denúncia contra ele em relação aos dois outros delitos. As acusações contra Fabiane e Roseli Loubet foram rejeitadas com base no artigo 395, inciso III, do Código de Processo Penal (ausência de justa causa para o exercício da ação penal).
Defesa
O advogado de Loubet afirmou que a denúncia está baseada apenas em “ilações e suposições”, sem apontar concretamente indícios mínimos de autoria, faltando justa causa à ação penal. Outro argumento foi o de que os depoimentos prestados em colaboração premiada, por si só, não constituem meio de prova aptos a justificar a abertura de ação penal contra qualquer pessoa. Ainda segundo a defesa, a movimentação financeira ocorrida entre seu cunhado e Pedro Paulo Leoni Ramos deu-se em virtude de empréstimo, que não contou com seu envolvimento ou anuência, além disso Loubet não tinha conhecimento de que parte desses valores seria utilizada para quitação de dívidas de sua campanha eleitoral de 2012.
Quanto aos supostos crimes de lavagem de dinheiro e associação criminosa, a defesa de Loubet afirmou também que a denúncia é omissa em apontar indícios de sua participação em atos que configurem ambos os delitos.
Da mesma forma, a defesa de Ademar Chagas da Cruz alegou que não haveria qualquer elemento indicativo de que ele tenha recebido qualquer valor da BR Distribuidora ou de proprietários das empresas mencionadas no inquérito. Segundo seu advogado, a denúncia apresenta contradições acerca dos fatos. A versão de que o dinheiro decorreu de empréstimo feito junto a Leoni Ramos também foi enfatizada, não havendo nisso qualquer traço de lavagem de dinheiro ou organização criminosa.
A defesa de Roseli Loubet pediu a rejeição da denúncia sob alegação de que não haveria qualquer elemento de prova de que tenha recebido qualquer valor da BR Distribuidora, ressaltando que ela foi inserida na denúncia apenas pelo fato de ser esposa do deputado e irmã de Ademar.
O advogado de Fabiane Avanci informou que ela é sócia de Ademar no escritório de advocacia, não tendo qualquer vínculo com suas atividades de assessoramento ao deputado Loubet. A defesa de Leoni Ramos também desqualificou a denúncia. Em relação à imputação de organização criminosa, arguiu a ocorrência de bis in idem pelo fato de Leoni Ramos ter sido denunciado pela prática do mesmo crime no Inquérito 4112. A defesa afirmou que haveria falta de justa causa para ação penal.
Relator
O ministro Edson Fachin, ao votar pelo recebimento da denúncia, afirmou que a peça acusatória oferecida pelo MPF descreve de forma clara os fatos imputados aos acusados e apresenta elementos que atestam a materialidade dos delitos e os indícios de autoria.
O ministro enfatizou que, ao contrário do que afirma a defesa, a denúncia não está amparada somente em depoimentos prestados em colaborações premiadas. “Há inúmeros outros indícios que reforçam as declarações prestadas pelos colaboradores, tais como dados telemáticos e bancários, depoimentos, informações policias e documentos, o que, nesse momento de cognição sumária, parece-me suficiente, eis que não se exige juízo de certeza acerca da culpa”, disse.
Segundo Fachin, esses elementos, dentre outras coisas, apontam que o próprio deputado, além de intermediário, teria recebido diretamente valores, que a evolução patrimonial dos acusados é incompatível com seus rendimentos e que, objetivando ocultação e dissimulação de origem e natureza dos valores indevidos por eles recebidos, foram em tese executados atos de lavagem de dinheiro.
Além disso, segundo Fachin, toda a estrutura criminosa segundo se extrai dos autos “foi arquitetada com o objetivo primário de repassar vantagens indevidas pagas no âmbito das diretorias que supostamente estariam submetidas ao controle político do senador Fernando Collor de Mello”. Esses atos estão sendo investigados no INQ 4112. “Em razão da divisão política que teria sido submetida na sociedade de economia mista com diretorias entregues ao domínio das bancadas do Partido dos Trabalhadores na Câmara dos Deputados, em especial de Vander Loubet, a mesma estrutura já estabelecida na BR Distribuidora teria sido empregada para percepção de vantagens indevidas mediante formas de ocultação e dissimulação da origem e natureza desses valores, com atuação direta, ao menos na condição de partícipe, de Ademar Chagas da Cruz, representante do deputado denunciado, perante Pedro Paulo e Alberto Youssef”.
Para o relator, a forma sob a qual se associaram os denunciados possuem “nítidos contornos de organização criminosa”. No entanto, de acordo com o relator, o delito de organização criminosa, neste caso, não pode ser imputado a Pedro Paulo, porque este já está sendo denunciado pelo mesmo crime no INQ 4112. “Como já foi denunciado naquele inquérito a oferta de nova denúncia configura evidente ofensa ao princípio do bis in idem”, disse.
O ministro entendeu ainda não haver justa causa para ação penal em relação a Fabiane e Roseli Loubet. Para o relator, não há indícios de autoria suficientes para que se atribua às duas a prática das infrações constantes da denúncia. A acusação não sustenta que Fabiane tinha ciência dos atos de corrupção. Quanto a Roseli, os dados demonstram apenas que transações financeiras foram realizadas entre ela, o esposo Vander e o irmão Ademar. O voto do relator foi acompanhado, por unanimidade, pelos demais ministros da Turma.
SP,VP/AD