Inviável, por desvio de finalidade, HC que questiona homologação de colaboração premiada

O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello, julgou inviável a tramitação do Habeas Corpus (HC) 144426, impetrado pela Federação das Associações dos Advogados do Estado de São Paulo (Fadesp) em nome do “povo brasileiro”. O HC questionava decisão do ministro Edson Fachin, tomada na Petição (PET) 7003, que homologou acordo de colaboração premiada firmado entre executivos do grupo empresarial J&F e o Ministério Público Federal. Segundo o ministro Celso de Mello, o habeas corpus não pode ser utilizado para tal finalidade, uma vez que este instrumento processual visa a tutela da liberdade individual.

A federação buscava invalidar a decisão do ministro Fachin e, por consequência, que fosse autorizada a continuidade de ações penais e oferecimento de novas denúncias contra os colaboradores, bem como eventual prisão processual. Para os advogados da federação, o acordo foi firmado fora dos termos legais e, por isso, não deveria ter sido homologado. Alegou ainda leniência por parte do Ministério Público para com os colaboradores, “ofertando e aceitando acordo que possibilitou aos autoincriminados delatores e articuladores de imenso esquema de corrupção política a consolidação da impunidade por seus crimes”.

O ministro Celso de Mello explicou que os objetivos buscados pela entidade não podem ser postulados por meio de habeas corpus, sob pena de “gravíssima subversão” dos fins a que se destina esse instrumento constitucional, que visa à proteção da liberdade de locomoção física de quem sofre constrangimento por parte de órgãos ou de agentes estatais. Por essa razão, segundo o ministro, não pode o HC ser utilizado como instrumento de tutela dos direitos do Estado em face do indivíduo. “Inexiste, na realidade, em nosso sistema de direito positivo, a figura do habeas corpus pro societate”, lembrou.

Em sua avaliação, a impetração do habeas corpus com desvio de sua finalidade, “objetivando comprometer os direitos de qualquer pessoa sob investigação ou persecução penal do Estado, descaracteriza a própria essência desse instrumento exclusivamente vocacionado à proteção da liberdade individual”.

Outro óbice para a tramitação do HC 144426, segundo o ministro Celso de Mello, é que se volta contra decisão de ministro do STF. Isso porque a jurisprudência do Tribunal é no sentido do não cabimento de habeas corpus em tal hipótese. Embora ressaltando sua posição pessoal em sentido contrário, ele aplica esse entendimento ao caso dos autos em razão do princípio da colegialidade.

Ainda segundo o decano, a inviabilidade do habeas corpus se revela por ter sido formulado em favor de um grupo indeterminado de pessoas – o povo brasileiro –, que compõe uma coletividade anônima. Esta circunstância impede que seja observada a exigência do artigo 654, parágrafo 1º, alínea “a”, do Código de Processo Penal, segundo a qual a petição do habeas corpus conterá o nome da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou coação. Ele destacou que a jurisprudência do STF tem acentuado a inviabilidade do HC impetrado em favor de “terceiros não identificados”.

Quanto ao pedido alternativo para recebimento do HC como mandado de segurança, o ministro explicou que o pleito não pode ser acolhido, uma vez que a entidade não teria legitimidade para a impetração. Além disso, lembrou que a jurisprudência do Supremo não admite mandado de segurança contra decisões de natureza jurisdicional proferidas por colegiado ou por ministros da Corte.

Leia a íntegra da decisão do ministro Celso de Mello no HC 144426.

AR/AD
 

Postado originalmente no portal do Supremo Tribunal Federal

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