Nesta quinta-feira (9), o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deu início ao julgamento de um recurso na Reclamação (RCL) 23045, no qual se discute a forma da contagem de prazo no contexto de Reclamações quando o ato questionado envolver processo de natureza penal ou processo de natureza civil. O ministro Dias Toffoli pediu vista dos autos em razão de ser relator de outra ação (Reclamação 25638) que tem conexão com a matéria, a fim de que os processos sejam julgados em conjunto.
A RCL 23045 foi ajuizada contra ato do delegado titular de Franco da Rocha (SP) e do juiz de Direito da Vara Criminal da mesma Comarca em razão de apreensão da integralidade de todo acervo de um escritório de advocacia – inclusive de processos que tramitam em segredo de justiça e documentos originais de clientes –, realizada sem a presença de um representante da OAB. A presente Reclamação foi apresentada sob o fundamento de violação à autoridade de decisão proferida pelo Supremo na Ação Cautelar (AC) 3914, na qual o presidente do Corte, à época, ministro Ricardo Lewandowski, determinou cautelarmente que fosse respeitada a inviolabilidade dos escritórios de advocacia, estendendo os efeitos dessa decisão a todos os advogados que estivessem em situação análoga.
O antigo relator da matéria, ministro Teori Zavascki (falecido), negou seguimento à Reclamação tendo em vista que o reclamante não participou da relação processual, faltando legitimidade para utilização da via. Essa decisão foi questionada por meio de embargos de declaração, quando o recorrente argumentou que não se trata de reclamação fundada em precedentes ou decisões tomadas em processos de índole subjetiva, mas em decisão respeitável cujos efeitos se estenderam a todos os advogados que estavam na mesma situação. Os embargos de declaração não foram acolhidos em razão de intempestividade, ou seja, por terem sido apresentados fora do prazo.
Problemática dos prazos
A decisão do ministro Teori Zavascki, que negou seguimento à Reclamação, foi publicada em 19 de maio de 2016 (quinta-feira). A contagem do prazo para a interposição do recurso teve início no dia 20 de maio (sexta-feira) e terminou em 24 de maio (terça-feira). Porém, o recurso [embargos de declaração] só foi protocolado no dia 27 de maio daquele ano (na sexta-feira seguinte), portanto, fora do prazo de 5 dias, previsto no parágrafo 1º do artigo 337 do Regimento Interno do STF.
Segundo o ministro Teori Zavascki, o artigo 798 do Código de Processo Penal (CPP) determina que todos os prazos serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou feriado. Para ele, seria inaplicável, no processo penal, a regra de contagem de prazo estabelecida no artigo 219, caput, do Código de Processo Civil (CPC), que prevê que na contagem do prazo somente serão computados dias úteis. Por essa razão, o ministro não conheceu (julgou incabível) dos embargos de declaração. Essa inadmissão foi questionada por meio de agravo regimental, recurso que teve análise iniciada hoje pelo Plenário do Supremo.
Voto do relator
O atual relator da matéria, ministro Edson Fachin, votou no sentido de negar provimento ao agravo regimental, portanto, mantendo a decisão do ministro Teori Zavascki de não acolher os embargos de declaração por intempestividade (interposto fora do prazo). Ele entendeu que o prazo de cinco dias peremptórios (corridos) não foi cumprido.
O ministro Edson Fachin adotou posicionamento no sentido de que, em matéria de processo penal, prevalece a lei especial, assim, no caso, seria aplicado o artigo 798 do CPP. Ele reconheceu que haverá dois critérios distintos para a contagem de prazo em matéria de processo, um para processo civil e outro para processo penal, “portanto, a matéria não é isenta de controvérsia”. “A interpretação sistemática do Código de Processo Civil, em meu modo de ver, não se direciona a regular aspectos disciplinados no âmbito processual penal. Entendo que, até mesmo na ambiência de aplicação subsidiária é possível extrair que o destino do CPC não se amolda a essa disciplina”, ressaltou.
Segundo o ministro, o artigo 15 do CPC estabelece que, na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições desse código lhe serão aplicadas supletiva e subsidiariamente. “Estou a entender que isso não significa que as normas do processo civil não possam ser aplicadas subsidiariamente ao processo penal. Contudo, tal proceder não decorre do suposto caráter geral do Código de Processo Civil”, avaliou.
O relator observou que “a incidência do CPC cinge-se às hipóteses afetas ao direito processual civil ou hipóteses em que o direito processual penal não contenha disposição sobre essa matéria, mas na presente matéria, contém, e com critério diferente do processo civil”. “Em razão de ausência de hierarquia, o critério, em verdade, relaciona-se ao grau de aproximação e semelhança em hipótese não disciplinada e o dispositivo empregado para o preenchimento da lacuna. Nesse viés, recomendável que na hipótese de Reclamação a forma da contagem do prazo observe a natureza do processo ou do procedimento em que o ato está inserido, se civil ou penal”, salientou.
Dessa forma, o ministro Edson Fachin concluiu que, no contexto de reclamações na hipótese de o ato questionado ter sido produzido em processo ou procedimento de natureza penal, a contagem de prazo se submete ao artigo 798 do CPP.
EC/CR