A ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu os efeitos de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Acre (TJ-AC) que manteve decisão liminar obrigando a administração estadual a reparar defeitos, supostamente de infraestrutura, em dois conjuntos habitacionais no Município de Cruzeiro do Sul. Na decisão tomada na Suspensão de Tutela Antecipada (STA) 853, a ministra verificou que a manutenção da decisão questionada geraria risco de lesão à ordem e à economia públicas.
No caso, o Ministério Público do Acre (MP-AC) ajuizou ação civil pública a partir de denúncia de uma cidadã em relação à infraestrutura de dois conjuntos habitacionais, “Miritizal Novo” e “Vale dos Buritis”, que haviam sido inaugurados em 2009 e 2011, respectivamente. De acordo com o MP, as obras teriam sido realizadas em desacordo com a legislação ambiental, pois as estações de tratamento de esgoto (ETEs) nunca funcionaram regulamente. Na ação, o MP pediu que a administração estadual, contratante da obra, e a administração municipal, responsável pela manutenção das vias públicas, realizassem reparos compreendendo desde o desentupimento de bueiros, reativação e manutenção periódica das ETEs, obras de contenção de ruas e calçadas, e limpeza da área, com a coleta do lixo urbano.
O juízo da Segunda Vara Cível de Cruzeiro do Sul deferiu antecipação de tutela entendendo que, pelas alegações nos autos, os problemas de infraestrutura não seriam decorrentes da construção em si ou da falta de manutenção, mas unicamente advindos de negligência e imperícia na elaboração do projeto estrutural, de responsabilidade do governo estadual. Na decisão, foi fixado prazo de 180 dias para que sejam efetuados os reparos solicitados pelo MP, fixando multa diária de R$ 50 mil pelo descumprimento do prazo. Em seguida, ao julgar agravo de instrumento interposto pelo governo estadual, o TJ-AC manteve a decisão de primeira instância.
No STF, o Estado do Acre sustenta que, a partir do registro do loteamento em cartório, as vias públicas e equipamentos urbanos constantes do projeto passam a integrar o domínio do município. Aponta que eventual falha na execução seria de responsabilidade da construtora e que a execução das obras representaria prestar serviço público de saneamento básico, que seriam de responsabilidade do município.
Decisão
A presidente do STF observou que a decisão questionada impôs ao estado providências que esgotam o objeto da ação civil pública, reconhecendo-lhe a responsabilidade exclusiva pelas obras, o que só poderia ser feito após o exame de provas a serem produzidas no processo. Segundo ela, “causa estranheza” a atribuição à administração estadual dos serviços de limpeza urbana, entre os quais, cuidados com calçadas e vias urbanas.
A ministra Cármen Lúcia destacou a que a concessão da tutela antecipada na hipótese configura lesão à ordem pública, uma vez que Lei 8.437/1992, que disciplina a concessão de medidas cautelares contra atos do Poder Público, veda expressamente a concessão de liminar que esgote, “no todo ou em qualquer parte, o objeto da ação” (artigo 1º, parágrafo 3º). Para a ministra, ficou configurada ainda lesão à economia pública, pois o governo estadual pode ser obrigado a realizar obras que, no julgamento de mérito da ação civil pública, podem ser declaradas como de responsabilidade do município.
“A urgência da atuação do ente ou dos entes aos quais se responsabilizar pela ação não autoriza a substituição de um pelo outro por decisão judicial sem respaldo na distribuição constitucional de atribuições”, concluiu Cármen Lúcia ao deferir a suspensão de tutela antecipada, até o julgamento do mérito da ação civil pública em curso na Justiça do Acre.
PR/AD