O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, na sessão plenária desta quarta-feira (2), o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 350, que discute se a norma da Constituição do Estado de São Paulo que proíbe a caça naquela unidade da federação invadiu a competência normativa da União. Após o voto do relator, ministro Dias Toffoli, que confere ao dispositivo interpretação conforme a Constituição Federal no sentido de admitir a caça unicamente em casos excepcionais (fins científicos e controle populacional de espécies) e sendo acompanhado por outros seis ministros, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
A ADI 350 foi proposta pelo procurador-geral da República, a partir de provocação da Associação Brasileira de Caça e Conservação, contra o artigo 204 da Constituição paulista, que proíbe a caça em todo o estado. De acordo com a ação, a norma é inconstitucional, pois, em seu entendimento, a Lei Federal 5.197/1967, que regula a matéria, não teria proibido a caça, o que inviabilizaria sua proibição por um estado-membro da federação. Alega violação ao artigo 24, parágrafo 1º da Constituição Federal, que diz competir à União estabelecer normas gerais sobre o tema.
Em seu voto (leia a íntegra), o ministro Dias Toffoli salientou que a lei federal, ao contrário do que é alegado na ADI, proíbe a caça, admitindo exceções unicamente quando as peculiaridades regionais comportarem essa prática. Observou que, ainda assim, a regulamentação deve ocorrer por meio de norma federal. Destacou que a Lei 5.197/1967 é compatível com os princípios da Constituição Federal de 1988 relativos à proteção à fauna. Segundo ele, a competência concorrente dos estados membros sobre o tema refere-se unicamente a suplementar a norma federal para adequá-la às características locais.
No entendimento do relator, a autorização da caça deve se ater às peculiaridades regionais e levando em conta os ecossistemas locais. Segundo ele, não há dúvidas de que os estados podem definir onde, como, quando e em quais situações é possível exercer a atividade de caça, mas podem também reforçar a proteção e preservação da fauna local. Ressaltou que a regra geral, prevista na norma federal, é a proibição da caça.
No caso de São Paulo, o ministro observa que as informações anexadas aos autos pela Assembleia Legislativa apontam a impossibilidade de incluir o estado entre essas exceções, em razão da grande atividade industrial, da agricultura intensiva, além de ter o maior contingente populacional, todos fatores de grande impacto sobre o meio ambiente. O relator destaca que laudos de diversos órgãos públicos estaduais (Cetesb, Sabesp, CPFL) e da própria Secretaria Estadual de Meio Ambiente atestam a escassez de animais, inclusive em regiões distantes da capital e de outros centros urbanos, e também a redução da cobertura vegetal local.
Segundo o ministro, com base nas informações é possível concluir que, à época da promulgação da constituição estadual, praticamente todas as espécies da fauna local estavam ameaçadas de extinção e muitas já extintas. Segundo ele, a norma da Constituição paulista visa à proteção do meio ambiente, atendendo às diretrizes da Constituição Federal para a defesa e proteção das espécies em risco de extinção. “Não se trata, portanto, de vedação arbitrária, mas plenamente justificável e imprescindível para atender suas necessidades” .
Dessa forma, o ministro votou no sentido de julgar a ADI parcialmente procedente, unicamente para conferir interpretação conforme a Constituição Federal à expressão “sob qualquer pretexto” no sentido de admitir a autorização da caça unicamente para fins de pesquisa científica ou para controle populacional de espécies que ameacem o equilíbrio ambiental, em ambos os casos, mediante autorização do poder público.
PR/CR
Postado originalmente no portal do Tribunal Superior Federal