Relatora entende que aplicativos de mensagens não podem ser obrigados a fornecer dados criptografados

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, nesta quarta-feira (27), o julgamento conjunto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5527 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 403, que têm como questão de fundo a possibilidade de decisões judiciais autorizarem o bloqueio de serviços de mensagens pela internet, como o aplicativo WhatsApp.

Na ADI 5527, de relatoria da ministra Rosa Weber, o Partido da República questiona a constitucionalidade de dispositivos do Marco Civil da Internet (artigos 10, parágrafo 2º, e 12, incisos III e IV) que têm servido de fundamentação para decisões judiciais que determinam a suspensão dos serviços de troca de mensagens entre usuários da Internet. Já a ADPF 403, relatada pelo ministro Edson Fachin, foi ajuizada pelo partido Cidadania contra decisão judicial que determinou o bloqueio nacional do WhatsApp diante da recusa da empresa em fornecer, no âmbito de uma investigação criminal, o conteúdo de mensagens trocadas entre usuários.

Inviolabilidade das comunicações

Única a votar na sessão desta quarta, a ministra Rosa Weber observou que a Constituição Federal assegura a inviolabilidade do sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, exceto por ordem judicial, nas investigações criminais e persecuções penais. Nesse sentido, ela considera que o conteúdo das comunicações privadas somente poderá ser disponibilizado mediante ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer, e unicamente para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, conforme a regra constitucional.

Criptografia

A relatora observou que, como a maior parte dos aplicativos de mensagens utiliza criptografia de ponta a ponta, para que apenas remetente e destinatário tenham acesso ao conteúdo, a lei não pode ser interpretada de forma a impor punição pela não disponibilização de mensagens às quais o prestador de serviços não tem acesso. Segundo a ministra, a criptografia é amplamente utilizada porque torna as comunicações online mais seguras e possibilita, por exemplo, o comércio eletrônico, as transações bancárias eletrônicas e até mesmo a segurança de grupos de direitos humanos que atuam contra regimes opressivos em todo o mundo.

Segundo ela, a criptografia é hoje uma ferramenta indispensável à proteção da privacidade e não é possível obrigar as empresas a deixarem de utilizá-la, sob pena de violar os princípios da proteção do sigilo das comunicações e das informações. “Qual seria o sentido de uma Constituição que em 2020 protegesse o sigilo das comunicações telegráficas, mas não o fizesse quanto ao sigilo das comunicações pela internet ou por qualquer outro meio pelo qual as pessoas lancem mão para se comunicar, inclusive de forma instantânea?”, questionou.

Fragilização da proteção

Para a relatora da ADI 5527, as penalidades de suspensão temporária e de proibição de exercício das atividades previstas no Marco Civil da Internet somente podem ser impostas aos provedores que descumprirem a legislação brasileira sobre coleta, guarda, armazenamento ou tratamento de dados. As punições, a seu ver, também são aplicáveis aos que violem os direitos da privacidade, a proteção dos dados pessoais e o sigilo das comunicações privadas e dos registros. A ministra afastou qualquer interpretação da lei que permita a punição pela inobservância de ordem judicial que determine a disponibilização de conteúdo de comunicações mediante a fragilização deliberada dos mecanismos de criptografia voltados à proteção da privacidade.

O julgamento continua na sessão de quinta-feira, com o voto do ministro Edson Fachin, relator da ADPF 403.

PR/CR//CF

Veja a reportagem da TV Justiça:

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