O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6395, ajuizada por 17 partidos políticos contra trechos de resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que tratam do processo de prestação de contas e do recebimento de cotas do Fundo Partidário. A decisão se deu em sessão virtual encerrada no dia 28/8.
O parágrafo 11 do artigo 36 da Resolução 23.604/2019 do TSE restringe a possibilidade de apresentação de documentos durante o processo de prestação de contas, ao não aplicar esse direito à hipótese de não atendimento pelo órgão partidário das diligências determinadas pelo juiz ou pelo relator. Já o inciso IV do artigo 28 da Resolução 21.841/2004 estabelece que o cumprimento da sanção de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário deve ser observado a partir da data de publicação da decisão.
Para os partidos, os dispositivos violam os princípios da separação dos Poderes e da reserva legal, pois disciplinam matérias restritas à competência de lei federal e extrapolam seu conteúdo normativo. Em relação à Resolução 23.604/2019, as legendas apontam inobservância aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa e sustentam divergência em relação à Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096/1995), que dispõe que os órgãos partidários poderão apresentar documentos hábeis para esclarecer questionamentos da Justiça Eleitoral ou para sanear irregularidades a qualquer tempo antes da decisão definitiva sobre a prestação de contas.
Resultado útil
Em relação ao dispositivo da Resolução 23.604/2019, todos os ministros seguiram o voto do relator, ministro Gilmar Mendes, pela sua constitucionalidade. A seu ver, o objetivo da medida é garantir um resultado útil ao processo de prestação de contas partidárias. Ele destacou que a Lei dos Partidos Políticos estipula em cinco anos o prazo para o julgamento das contas dos partidos. A imposição de prazos pela autoridade que conduz o processo de tomada de contas, a seu ver, configura previsão que confere racionalidade ao sistema. “Evita-se, com isso, um total esvaziamento do comando constitucional de prestação de contas”, sustentou.
O ministro também não verificou qualquer usurpação da competência legislativa do Congresso Nacional ou ofensa ao princípio da legalidade, pois o dispositivo questionado veicula comando extraído a partir de uma análise sistemática de diversos comandos legais, como a Lei dos Partidos Políticos e o Código de Processo Civil.
Caráter nacional dos partidos
Já em relação à Resolução 21.841/2004, a maioria considerou constitucional o dispositivo questionado, seguindo o voto divergente do ministro Edson Fachin. Para a corrente majoritária, embora o marco temporal da aplicação da sanção aos diretórios partidários que tiverem suas contas desaprovadas não conste no dispositivo que a fundamenta (artigo 37), trata-se de mero requisito para a eficácia da sanção e, para este fim, basta a sua publicação.
De acordo com o ministro Edson Fachin, o diretório hierarquicamente superior tem apenas o ônus de deixar de efetuar o repasse, sendo prescindível, para fins de aplicação da cláusula do devido processo legal, a sua intimação específica. Segundo ele, ainda que essa exigência tenha sido incluída pela Lei 13.877/2019, a interpretação deve ser feita à luz da Constituição Federal, que, ao estabelecer que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal, não autoriza a extensão da necessidade da intimação pessoal a quem não é parte.
O ministro ressaltou ainda que o TSE afasta a tese de desconhecimento do julgamento de desaprovação das contas do diretório estadual e apontou o caráter nacional dos partidos políticos. “Ao diretório que teve as contas desaprovadas, exige-se, pela própria boa-fé, que comunique ao órgão superior a sanção ou proceda ao estorno do repasse indevido”, assinalou. “Não configura, assim, exigência inconstitucional o cumprimento da suspensão do repasse a partir da publicação da decisão”.
Ciência inequívoca
Ficaram vencidos o ministro Marco Aurélio e o relator, que convertia a ADI em arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). Em seu voto, ele propunha que se conferisse ao dispositivo interpretação no sentido de impedir a punição de órgão partidário hierarquicamente superior em razão de repasse indevido de cotas do Fundo Partidário sem a devida comprovação de sua inequívoca ciência, mediante intimação ou citação, da sanção impeditiva do repasse aplicada pela Justiça Eleitoral a órgão estadual, distrital ou municipal.
Segundo o relator, na época da edição da Resolução 21.841/2004, a norma legal que respaldava o artigo questionado previa que a falta de prestação de contas ou sua desaprovação total ou parcial implicaria a suspensão de novas cotas do Fundo Partidário e sujeitava os responsáveis às penas da lei, mas não menciona o marco temporal da suspensão ao acesso a novas cotas.
Na avaliação do ministro Gilmar Mendes, ao prever que a suspensão do acesso a novas cotas se daria a partir da publicação da decisão, o dispositivo deixou de observar aspecto primordial afeto ao devido processo legal. Isso porque, segundo ele, atribuiu consequências jurídicas graves a quem sequer integrou a lide processual (os partidos), como a desaprovação de suas contas. “A possibilidade da existência de uma grande quantidade de órgãos partidários municipais (o país conta com aproximadamente 5.500 municípios) torna praticamente impossível aos órgãos superiores o acompanhamento individualizado dos processos de prestação de contas das esferas partidárias hierarquicamente inferiores”, afirmou.
RP/AS//CF
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